Nos últimos anos, 3 filmes me marcaram especialmente por suas cenas finais. São momentos que nem precisavam existir para que o longa fosse aclamado, mas cujas presenças funcionam como uma cereja de bolo para a catarse das histórias contadas. O primeiro foi Dor e Glória (2019), do Almodóvar, o segundo foi Assassinos da Lua das Flores (2023), do Scorsese, e agora Zona de Interesse (The Zone of Interest), de Jonathan Glazer.

Com 5 indicações ao Oscar 2024, o novo longa do diretor e roteirista de Sob a Pele (2013) e Reencarnação (2004) retrata o cotidiano da família do então comandante do campo de concentração de Auschwitz, Rudolf Höss, interpretado por Christian Friedel (Babylon Berlin).
Com a casa dos protagonistas literalmente dividindo o muro com Auschwitz, observamos a banalização do momento vivido através do dia-a-dia de quem se favorecia com as atrocidades e crimes cometidos na época. As preocupações com a rotina de filhos e com o jardim mostram a crueldade de um jeito diferente de outras produções que escolhem abordar o tema explicitando a tortura e a tristeza da vida dos perseguidos presos em campos de concentração. A forma como as crianças lidam com a situação dão uma pesada amostra de como o momento já estava enroscado a suas realidades.

Para acentuar esse desconforto, o som tem papel primordial. E desde a cena inicial isso é marcado para o espectador, que é mergulhado em sons à princípio não identificáveis enquanto na tela apenas se vê cores sem uma forma específica, algo que acontece em mais de um momento do longa. Do lado do muro em que não vemos a violência fisicamente, escutamos o som de máquinas, fogo e gritos que parecem crescer ou se tornam mais marcantes ao longo do filme. É como se fôssemos forçados a nos acostumar com esses sons infernais ao fundo, assim como os protagonistas fazem de forma natural.
As escolhas visuais também levam o longa para um lado artístico que combina bem com a falsa tranquilidade mostrada em tela. A câmera parada, sempre mostrando os cômodos de dentro da casa pelos mesmos ângulos, como em um jogo de videogame, reforça a rotina e a monotonia da vida das pessoas que fingem não saber ou simplesmente naturalizam o que acontece do outro lado do muro. Esse reforço é tão grande que, após a sessão, não foi incomum ouvir espectadores que consideraram o filme chato, mas considero que foi um risco escolhido a se correr pela proposta de como a história é contada.

Ainda falando da parte visual, dois momentos se destacam: a parte onírica presente na representação dos sonhos de uma das filhas do casal protagonista e o momento em que a sogra do protagonista observa com horror nos olhos e uma forte luz vermelha em seu rosto o que realmente acontece no ambiente vizinho ao da casa. A esposa de Rudolf, aliás, é interpretada pela contida e excelente Sandra Hüller (Anatomia de uma Queda).
A cena final, citada no começo do texto, deixa de lado qualquer resquício de pensamento de empatia pelos protagonistas. É importante ter, nos dias de hoje, a memória do que foi o nazismo. Somos constantemente assustados pela força que essa ideologia ainda tem e a forma como, na verdade, ela ainda parece crescer.
NOTA: 4/5
