Retratar hoje o período da pandemia de Covid em um filme pode ser arriscado. Entre as possibilidades, pode-se criar uma obra que ouse com os gêneros e, de repente, até transforme a experiência em algo bastante individual para seus protagonistas. Mas também é possível optar por algo mais seguro, fazendo um retrato fiel do que foi vivido e mergulhando na reflexão dos personagens sobre o momento. Em Tempo Suspenso (Hors du temps), o diretor francês Olivier Assayas segue essa segunda opção, infelizmente.
Paul (Vincent Macaigne), um diretor de cinema, e seu irmão Etienne (Micha Lescot), um jornalista cultural, estão confinados juntos na casa de infância com suas parceiras, Morgane (Nine d’Urso) e Carole (Nora Hamzawi). A relação entre os quatro restritos pelo lockdown é intercalada com narrações do diretor, que explica para o público sobre a casa, cômodos e objetos importantes para a história da família.
A convivência entre os dois irmãos é a central do longa; eles discutem referências artísticas e relembram o passado familiar. Um atrito ou outro é gerado, mas as principais questões são sempre sobre a diferença de como cada um lida com a quarentena. Hoje, pouco tempo após o que vivemos coletivamente, o filme desperdiça longos e chatos minutos em discussões sobre proteção contra o coronavírus e na obsessão do protagonista por higiene.

As mulheres da história servem apenas para comentar as crises dos homens, dando uma informação aqui e ali sobre os relacionamentos passados dos dois. As únicas conversas que as duas têm sozinhas é, pasmem, também sobre os relacionamentos de ambas. Há ainda a presença da ex-mulher, da filha e da terapeuta de Paul. Coitada dessa última. As conversas servem apenas para “elevar” o personagem principal e acrescentar críticas sociais fáceis, como a proibição de que a filha assista Netflix (estamos falando do período pandêmico, veja só!).

O pedantismo, aliás, está presente em ambas as esferas do longa. As narrações sobre o passado do lugar são repletas de referências vazias à escritores e pintores enquanto a história que acompanhamos chega a fazer um mergulho metalinguístico que é quase interessante nas reflexões de Paul enquanto diretor de cinema. Mas sempre há uma quebra mais pedante, como quando os personagens conversam sobre um podcast em que Jean Renoir fala sobre o próprio pai. Não bastasse o tema ser super exposto nas conversas, há até mesmo o uso de um lettering na tela para indicar determinadas obras citadas.
Tentando emular um cinema em que nada acontece e focado nos diálogos, a direção não chama atenção positivamente, exceto talvez ao intercalar entre as duas formas de narrativa apresentadas. Me preocupa, aliás, que Paul, o protagonista, seja uma projeção de Assayas na tela (com certeza é, ele chega até a citar uma possível parceria com Kristen Stewart para um de suas produções), uma vez que personagem beira o insuportável em momentos como o de sua obsessão por limpar uma panela queimada.

O epílogo, mais interessante que todo o resto, chega tarde demais e ocupa mais de dez minutos no final das quase duas longas horas de duração do longa. Há uma conversa bonita, e presencial, de Paul com sua filha, que também é uma menina meio pedante, mas que mostra uma ponta de esperança de que talvez não siga o caminho bastante enfadonho de seus familiares.
NOTA: 1,5/5