Ambientado no litoral cearense, Motel Destino apresenta a história de Heraldo (interpretado pelo incrível prodígio Iago Xavier), que, sendo perseguido por uma dívida, busca refúgio em um motel de estrada gerenciado por Dayana (Nataly Rocha) e Elias (Fábio Assunção). O diretor Karim Aïnouz, nascido em Fortaleza, aposta nas cores fortes naturais externas e nos tons vermelhos do interior do motel. Tudo é muito quente, fator ressaltado pelo suor e sujeira sempre presentes na pele dos protagonistas. Uma romantização da vida cotidiana daquele ambiente, onde fica parecendo que tudo pode acontecer e leis não são devidamente seguidas.

O diretor volta à sua terra natal e é curioso associar elementos desse longa com o espetacular O Céu de Suely (2006). Enquanto há quase 20 anos acompanhávamos a busca de Suely por melhores condições de vida para ela e seu bebê, agora o som do choro infantil fora de tela é substituído por gemidos de prazer dos clientes do motel, embalando a história dos protagonistas, que parecem viver em um universo paralelo no ambiente claustrofóbico em que trabalham. A locação do motel, aliás, é um dos destaques do filme gravado em Beberibe, com destaque para o corredor de serviço em que os funcionários têm acesso aos quartos e que é um dos cenários mais marcantes e presentes do longa.
A excelente química entre o trio protagonista possui explicações que vão além da qualidade dos atores: a equipe contou com a presença de uma coordenadora de intimidade no set e teve a rara oportunidade de ter um mês de ensaio em locação antes das gravações começarem. O resultado é visto nas atuações que extrapolam os diálogos, que estão longe da mediocridade e se apresentam de forma muito natural, outra boa marca dos longas do diretor. Conseguimos perceber as relações dos personagens se estreitando em suas ações e reações. A aproximação de Heraldo e Dayana, sendo controlados por esse cara branco e miliciano do Rio de Janeiro, é complexa e íntima, enfrentando situações que os deixam ainda mais conectados. Se livrar de um corpo juntos é um ato de muita intimidade. É lindo quando os três personagens aparecem juntos, organizados em elaborados enquadramentos em tela.

Essas ações e reações ganham força com uma técnica que Karim diz ter se inspirado em David Fincher, que grava uma versão de suas cenas sem diálogos para poder capturar detalhes de emoção que às vezes passam despercebidos quando a voz também está em cena. Na montagem, é possível até cortar algumas linhas de fala dos personagens quando olhares e gestos já podem transmitir a mensagem desejada. Mas nem sempre o roteiro movimentado de Motel Destino faz bom uso dessa fórmula: algumas conversas são bastante expositivas. E a falta de diálogo às vezes não explica o momento, como quando Dayana deixa Heraldo entrar escondido no motel pela primeira vez.
“O perigo é bom, azeita as coisas” é uma frase dita por um dos personagens e que se reflete em tela a todo momento. Na reta final, essa claustrofobia do motel também faz o personagem de Iago fugir de sua vida e de quem é. Enquanto Fábio Assunção apela para o tom constrangedor no melhor dos sentidos, Nataly Rocha aposta certeiramente na já citada naturalidade. O resultado é delicioso, mas não consigo deixar de pontuar certa falta de cuidado com personagens que não seguem algum tipo de heteronormatividade, como se houvesse um julgamento a toda sexualidade reprimida ao fugir desse padrão. A construção sexual entre Elias e Heraldo, por exemplo, nunca se concretiza fortemente, o que é uma grande perda para a narrativa ao ser colocada apenas na condição do “será?”, mesmo diante de diversos momentos em que os corpos masculinos são explorados sensualmente pela câmera.

Outra inspiração citada por Karim é Teorema (1968), do Pasolini. A presença de Heraldo transforma para sempre a vida dos funcionários já acomodados na rotina de funcionamento do motel. E nada mais é o mesmo. Essas transformações se mesclam na estética do filme. Todo gravado em película, é fácil e sexy notar o destaque do suor, do vermelho e do neon. As cores dos lençóis e do céu sempre chamam atenção.
Talvez no futuro não se destaque na filmografia do diretor, mas Motel Destino definitivamente desperta a curiosidade de ver Karim trabalhar mais no Brasil, especificamente no Ceará. Tudo é muito bonito, sensual e bem pensado.
NOTA: 3,5/5



















